67º Aniversário da morte de Aristides de Sousa Mendes

Era realmente meu objectivo “salvar toda aquela gente”, cuja aflição era indescritível: Uns tinham perdido os seus cônjuges, outros não tinham notícias dos filhos extraviados, alguns haviam visto sucumbir pessoas queridas sob os bombardeamentos alemães que todos os dias se renovavam e não poupavam os fugitivos apavorados. Quantos tiveram que inhumá-las, antes de conseguirem prosseguir na louca correria da fuga!
Mas, além dêste aspecto emocionante ao máximo, que me enchia de comiseração por tanto infortúnio, outro havia para mim que não era para desprezar, o da sorte que estava reservada a tanta gente se caissem nas mãos do inimigo. (…)
Junte-se a êste espectáculo o de centenares de crianças, que, acompanhando os pais, participavam dos seus sofrimentos e angústias, demandando cuidados que êles, naquela situação, lhes não podiam prestar. Pensemos ainda que toda esta multidão, por falta de alojamento, dormia nas ruas e praças públicas sujeita à intempérie. (…)
Tudo isto não podia deixar de me impressionar vivamente, a mim que sou chefe de numerosa família e compreendo melhor do que ninguêm o que significa a falta da protecção à família.
Daí a minha atitude, inspirada única e exclusivamente nos sentimentos de altruísmo e de generosidade de que os portugueses, através dos seus oito séculos de história, souberam tantas vezes dar provas eloquentes e que tanto ilustram os nossos feitos heróicos. 

Aristides de Sousa Mendes, 1940.08.10
Arquivo Histórico-Diplomático – Ministério dos Negócios Estrangeiros
Processo disciplinar de Aristides de Sousa Mendes, doc. 51
Museu Virtual Aristides de Sousa Mendeshttp://mvasm.sapo.pt/BC/Arquivos/pt

Recordamos hoje, dia em que se assinala a sua morte, as palavras de Aristides de Sousa Mendes dirigidas, em 8 de outubro de 1940, ao então Ministro dos Negócios Estrangeiros, evocando os motivos que o levaram a passar vistos a milhares de refugiados do Holocausto, protegendo-os, assim, da morte.
No dia 3 de abril de 1954, não resistindo à contínua degradação do seu estado de saúde e situação de miséria decorrente das sanções impostas por Salazar, pela sua desobediência à Circular n. º14, Aristides de Sousa Mendes morreu, em Lisboa, no Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco, distante do que mais prezou em toda a sua vida: a sua família, obrigada a separar-se para sempre, pela impossibilidade de viver num país em que o seu nome passou a ser proscrito.

A dispersão geográfica dos descendentes diretos de Aristides de Sousa Mendes bem como dos refugiados que salvou e seus descendentes, é, ainda hoje, uma marca visível das consequências do seu gesto de Humanidade, de Amor e de Coragem.